O projeto internacional Waste2Brazil, que interliga Brasil e Alemanha na construção de novas oportunidades na gestão de resíduos no Rio Grande do Sul, ganhou mais um capítulo nesta semana, tendo a Fundação Proamb como elo entre os dois países.
Uma delegação empresarial da região alemã de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental visitou, na última quarta-feira, a unidade de coprocessamento da Proamb, em Nova Santa Rita, e a sede da organização, em Bento Gonçalves.
A movimentação faz parte das estratégias de aproximação do projeto, financiado pelo Ministério Federal Alemão do Meio Ambiente, Conservação da Natureza, Segurança Nuclear e Defesa do Consumidor. O programa já teve entre suas etapas a visitação de profissionais da Proamb para conhecer, na Alemanha, usinas do tipo “Waste to Energy”, voltadas à geração de energia através da incineração de resíduos. A tecnologia, conhecida também como reciclagem térmica, permite gerar energia de forma sustentável a partir da combustão dos resíduos. Com a queima, é gerada energia térmica, posteriormente transformada em energia elétrica.
Mas os ganhos não param por aí. Unidades de recuperação energética de resíduos contribuem para outras demandas mundiais. A presença delas significa diminuição no envio de resíduos para aterros, contribuindo para que esses espaços sejam utilizados apenas para acomodar material sem possibilidade de reciclagem, reduzindo, assim, a geração de gás estufa. É uma tecnologia, portanto, alinhada à mitigação de CO2 e que cumpre a agenda das mudanças climáticas. Na Europa, onde seu uso é consolidado, houve queda de 60% na destinação de resíduos sólidos urbanos em aterros, o que reduziu a emissão de gases em 42% entre 1995 e 2017, conforme a Agência Ambiental Europeia.
A instalação de uma solução nesses moldes na Serra gaúcha faz parte dos objetivos da iniciativa, que ainda visa a conscientização sobre os benefícios da economia circular e do uso de tecnologias ambientais. Ao saudar a presença germânica, o presidente da fundação, Neri Basso, destacou a caminhada pioneira da entidade como agente fomentador do desenvolvimento sustentável na Serra e os moldes de atuação da Fundação Proamb. “Nossa atuação se baseia na busca constante por tecnologia e inovação, e estamos em permanente contato com as principais referências internacionais em sustentabilidade. Temos expertise e uma equipe de excelência que nos traz resultados que reinvestimos na Proamb”, disse.
Líder da comitiva alemã, o chanceler de Mecklemburgo Pomerânia Ocidental, Patrick Dahlemann, disse que a Alemanha tem interesse em investir em projetos como esse porque o entende a partir de um contexto global. “Temos interesse porque com isso conseguimos criar uma proteção ao meio ambiente, o que é uma necessidade mundial. Precisamos criar uma cooperação a fim de que haja criação de valor e de riqueza para os dois lados”, comentou o chanceler, cargo equivalente no Brasil ao de governador.
Para concretizar a ação, um dos pontos a serem articulados diz respeito à legislação brasileira, que atualmente carece de normativas quanto a certas tecnologias, como a da reciclagem térmica. “Na Alemanha, temos marcos regulatórios que possibilitam há décadas o desenvolvimento de tecnologias seguras”, reforçou.
Assuntos como esse, bem como a quantidade e a qualidade dos resíduos gerados na região, entram agora numa fase de diagnóstico. O projeto não tem a intenção de simplesmente importar tecnologias, mas desenvolver uma aproximação com parceiros daqui e estudar que tipos podem ser desenvolvidas aqui. “Durante muitos anos existiu a ideia de que bastava trazer para cá a tecnologia da Europa, mas isso, passado um tempo, deixava de funcionar. Queremos evitar esse tipo de erro, por isso há uma fase muito maior de aproximação, para enxergar as tecnologias nos parceiros para que se entenda o que se pode ser feito aqui. É uma relação não de cima para baixo, mas de igual para igual. É uma perspectiva de cooperação para que quando for implementado algo tenha uma tropicalização das tecnologias existentes, adaptadas à realidade local para trazer benefícios ao meio ambiente”, disse Silvia Kohlmann, diretora executiva da Envitcpro, responsável pelo desenvolvimento do projeto.
Essa mesma percepção é compartilhada por Michael Sack, conselheiro distrital da Pomerânia Ocidental. Por lá, seu distrito se juntou a outros dois para, através de parcerias público-privadas, resolver a questão dos resíduos. “O Brasil precisa encontrar o seu próprio caminho para vencer os desafios, mas as empresas que aqui estão participando dessa missão estão dispostas a disponibilizar conhecimento, e esse tipo de interação permite que o Brasil não precise percorrer o longo caminho feito pela Alemanha, ele pode ser muito mais curto”, analisou. Frank Zörner, diretor executivo da BN Umwelt, outra empresa parceira do projeto, afirmou que colaborar com iniciativas como essas significam um avanço para toda sociedade. “Estou há 30 anos trabalhando na área de resíduos, e há 15 atuo no Brasil, procurando intermediar o conhecimento da Alemanha para cá. A reciclagem tem um grande valor e agrega valor para os produtos e para os processos de reciclagem”, destacou.
Além da Envitcpro e da BN Umwelt, faz parte do projeto de cooperação internacional o Grupo Dornier, que auxilia no conhecimento da utilização térmica e na operação de usinas, e a Universidade do Vale do Taquari (Univates). O Waste2Brazil está sendo desenvolvido desde 2020 e contou com treinamentos online para técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (Fepam), da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema-RS), da Secretaria de Meio Ambiente de Bento Gonçalves, e para integrantes da Univates, da Proamb e do Consórcio Intercomunal de Desenvolvimento Sustentável Serra Gaúcha (Cisga). Eles puderam conhecer, de modo virtual uma usina de reciclagem de PET, uma usina de incineração de resíduo sólido urbano e um aterro sanitário.
A visita dos alemães à unidade de coprocessamento da Proamb foi finalizada com a plantação de algumas espécies de árvores, entre elas o ipê-amarelo. A planta foi escolhida por causa de sua cor, presente nas bandeiras do Brasil, da Alemanha e do Rio Grande do Sul, como símbolo da união dos povos.
Plano para melhorar gestão de resíduos
A parte final da visita da comitiva ocorreu em Bento Gonçalves. Na sede da Proamb, a delegação conheceu o cenário e as oportunidades no setor de resíduos no Brasil.
Conduzido pelo Rubens Aebi, vice-presidente da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (Abren) e pelo vice do Conselho da mesma entidade, Francisco Leme, um levantamento nacional mostrou que em 2019, o Brasil gerou quase 80 milhões de toneladas de resíduos sólios urbanos, “24% deles estão em lixões ou não são coletados”. De acordo com o estudo da Abren, este resíduo emitiu 154 milhões de toneladas equivalentes de CO2, segundo Leme.
Apenas no Rio Grande do Sul, no mesmo ano, foram gerados 3,2 milhões de toneladas. “Isso demonstra a necessidade que temos para melhorar a gestão dos nossos resíduos”, disse Basso. Os dados vão embasar um documento que será entregue ao governo do Estado, durante a Fiema, assinado pela Proamb, Abren e parceiros alemães, com um plano para aumentar a capacidade de tratamento de resíduos. Aliás, os alemães retornarão a Bento Gonçalves, em maio, para participar da Fiema, entre os dias 9 e 11, cumprindo mais uma agenda de trabalho envolvendo o projeto Waste2Brazil. Essa parte do encontro contou com a presença de conselheiros e outros profissionais da Proamb, além do secretário municipal de Meio Ambiente, Osmar Bottega, e do diretor executivo do Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável da Serra Gaúcha (Cisga), Rudimar Caberlon.
Além da aproximação técnica oportunizada pelo encontro, houve espaço para um intercâmbio cultural entre brasileiros e alemães. A cultura vitivinícola da região foi apresentada durante um almoço na Vinícola Don Guerino, em Alto Feliz, enquanto o prato típico do Estado, o churrasco, foi apreciado em um jantar oferecido na Benestare, em Bento Gonçalves, de modo a irmanar ainda mais os povos brasileiros e alemães.
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